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Como descobri que não tenho fibromialgia


17/ago/2020 | Anielle Casagrande | #

Quando eu decidi engravidar em 2018 eu estava cheia de problemas de saúde e para piorar tinha um médico que não me apoiava para nada. A cada consulta, um balde de água fria novo e uma série de comentários estranhos como “já deixou de ser chata? Porque atendo gente com fibromialgia há 30 anos e todas são mulheres extremamente chatas”. Até o dia em que ele me disse que eu “não poderia ser mãe já que não segurava uma caneta”. Aquilo foi demais para mim. Tem gente com problemas de saúde (e mentais, emocionais, financeiros etc) muito mais sérios que isso e tem filhos. Fui muito firme na minha decisão de ir embora do consultório para nunca mais voltar. Não tive dúvida alguma de que estava fazendo o melhor para mim e meu marido me apoiou.

Fiquei meses sem médico mas sabia que precisava largar todos os remédios para poder tentar engravidar. Mas como fazia acupuntura com um médico três vezes por semana e ele era contra a quantidade absurda de remédios que eu tomava na época, ele me ajudou a largar todos um por um e acompanhou de perto. Isso foi muito importante. Eu tomava 9 remédios fortes na época, entre antidepressivos e sedativos, e já vinha tentando largar desde 2017 sem sucesso (a abstinência parecia que ia me matar. Tem vídeos da época em que relato a sensação). Para minha surpresa, assim que larguei tudo, todos os sintomas de “fibromialgia” que eu tinha sumiram, ficando só a dor nos punhos, que era o que eu tinha antes de tomar todo esse coquetel.

Passei 2017 assim (mas nem sempre vestida de Pikachu, calma)

Eu tinha tantos sintomas horríveis que passava meus dias na cama. Em 2017 passei o ano inteiro de cama. Meu marido tinha medo de me deixar sozinha em casa e me levava para minha vó sempre que ia trabalhar. Ele, que tinha dois empregos e dois podcasts pra tocar, me deu banho sentada num banco todo esse tempo e aprendeu a cozinhar e cuidar da casa. Em 2017 eu tinha 29 anos. Em 2016 eu tinha um bom emprego, tinha acabado de entrar na faculdade de engenharia, que era meu sonho, e tinha comprado um carro. De repente eu estava numa cama com todos aqueles sintomas. Foi assustador, não vou negar. Mas em momento algum suspeitamos que era tudo causado pelos remédios.

Só nós dois e minha mãe, que mora na Alemanha, sabemos tudo que passamos enquanto as pessoas só sabiam apontar o dedo pra me chamar de preguiçosa, dizer que ele era incrível por pagar todas contas sozinho e dar exemplo de pessoas que continuavam trabalhando com dor (sendo que eu passei ANOS sem conseguir segurar um copo de vidro ou abrir a porta do carro e até hoje não consigo usar MOUSE; mas observem quem ter dor crônica não é uma competição pra ver quem sofre mais).

Também ouvi de gente leiga que eu sentia dor por ser doente mental ou desequilibrada emocionalmente, sendo que minha dor no punho sempre foi por esforço físico desde o primeiro dia e nunca sofri de nenhuma doença mental. Se pra mim já era um inferno esses comentários imagine que pesado para quem realmente lida com algum problema de saúde mental? sad

Curiosamente, todas pessoas que gostavam de criticar e opinar na minha vida NUNCA vieram perguntar como eu estava. Aparentemente uma pessoa que não consegue trabalhar perde o status de “ser humano” para maioria das pessoas. Não vou criticar o capitalismo porque esse é um trabalho pro meu marido no podcast dele toda quinta-feira, risos, brincadeira, ou não.

Passei 2017 deitada. Aqui, na casa da minha avó.

O primeiro erro médico que ocorreu comigo infelizmente foi que o primeiro médico que busquei quando comecei a ter dor (fim de 2015) me receitou direto na primeira consulta dois opióides. Ou seja, meu primeiro remédio já foi uma bomba sem eu saber. Passei 2016 todo viciada em opióides e na deliciosa sensação que eles causavam. Quase bati o carro, ia trabalhar chapada e cheguei a implorar por uma receita médica de Tramadol na internet uma vez que estava ficando sem, tamanho o vício que me causou.

Na época, confiava no médico e não tinha noção do perigo dos opióides nem achava que estava viciada. Finalmente em dezembro de 2016 parei de tomar opióides porque pararam de funcionar, mesmo tomando direto na veia no hospital. Se você colocar “remédio mais perigoso do mundo” no google vai entender do que estou falando. Vou facilitar sua vida deixando o link direto aqui da reportagem da Superinteresante com esse nome: https://super.abril.com.br/especiais/o-remedio-mais-perigoso-do-mundo/.

Como diabos uma pessoa que foi criada tomando homeopatia chegou a tomar tantos remédios? Pois é. Primeiro, eu confiava nos médicos, achava mesmo que poderiam me ajudar. Também ocorreu um fato curioso em 2017: após uma série de diagnósticos inconclusivos (foram sete no total), fui encaminhada para um neurocirurgião para analisar uma dilatação que tenho na coluna cervical (até hoje faço uma ressonância por ano). Ele me prometeu que ia resolver minha dor e já na primeira consulta me receitou 7 remédios (além de 2 que eu já tomava), dizendo a seguinte promessa: “estou te receitando tudo que conheço para dor. Um deles vai funcionar”. Nunca funcionou e foi assim que começaram todos sintomas estranhos que me impossibilitavam de ter uma vida normal fora de uma cama. Também ganhei 8kg e com isso comecei a ter uma montanha de outros problemas de saúde que nunca tinha tido antes da pré-obesidade: níveis de colesterol e triglicerídeos altíssimos, pré-diabetes e parei de ovular, ficando infértil. Definição de infertilidade: incapacidade de engravidar num período de um ano sem ajuda médica.

Fevereiro e maio de 2017

No final de 2018 meu marido me levou ao pronto socorro por causa de uma dor chata nos pés que estava piorando dia após dia. Eu estava quase um ano com aquela dor e o reumatologista só sabia repetir que era fibromialgia, mas estava ficando realmente insuportável. No hospital o ortopedista garantiu que era tendinite e confirmou com exames de imagem. Olhou minhas mãos e também garantiu que era tendinite, mas como era um pronto socorro, me recomendou procurar tratamento para tendinite a longo prazo saindo dali.

Muita compressa, mesmo na minha viagem para a Tailândia em dezembro de 2018

Nos últimos dias de 2018, quase no natal, resolvi ir na clínica da dor de Curitiba e tudo mudou: agora sem nenhum sintoma além da dor nos punhos desde 2015, fui diagnosticada com tendinite crônica. Voltando da Alemanha em janeiro de 2019 comecei a fazer fisioterapia em domicílio e meses depois musculação e passei a ter uma qualidade de vida impressionante. A dor virou parte do dia a dia mas nunca mais fiquei de cama desde então. Isso para não citar novamente todos sintomas horripilantes que sumiram quando larguei os remédios. Percebam que prefiro não listar os sintomas que desenvolvi porque é bem assustador. Inclusive em 2019 comprei um carro automático e assim consegui voltar a dirigir! smile

Porém não sou contra remédios, de forma alguma. Mas no meu caso foram anos com todo tipo de sedativo e antidepressivo que nunca me ajudaram em nada. Percebam também que largar remédio sem acompanhamento médico não deve ser feito JAMAIS. O período em que larguei os remédios foi bastante traumático mesmo com acompanhamento médico 3 vezes por semana, dia sim dia não.

Essa é a história de como eu lutei sozinha (com apoio do meu marido e da minha mãe) contra uma série de diagnósticos errados e remédios que nunca me ajudaram em nada e só me deixaram com sintomas horríveis presa numa cama e sem conseguir tomar banho sozinha. Isso enquanto muitas pessoas me acusavam de ser dramática, folgada, de não gostar de trabalhar e gostavam de repetir que eu jamais seria mãe (inclusive ouvi isso na minha família). Finalmente em fevereiro de 2020 após uma pequena luta contra a infertilidade gerada pelo sobrepeso causado pelos remédios consegui engravidar e meu bebê é para novembro. smile

Quantos anos mais eu perderia da minha vida convivendo com aqueles sintomas incapacitantes causados por remédios se não fosse o meu desejo de engravidar?

Nicolas Mizanzuk, a razão de eu ter largado todos remédios, ficar livre de todos sintomas bizarros que me causaram e descobrir que nunca tive fibromialgia
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